Os problemas e a briga da direita

Os problemas e a briga da direita

Bolsonaro conseguiu levar milhares para a Paulista, mas coleciona derrotas que vão do fracasso de candidatos às brigas na extrema direita

O governador paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro em ato na Av.Paulista — Foto: Maria Isabel Oliveira/O Globo

Porto Velho, Rondônia -
Jair Bolsonaro conseguiu reunir uma multidão na Avenida Paulista, mas, ao mesmo tempo, viu as fraturas dentro do seu grupo e já sabe que vai perder a eleição no seu reduto. Na Polícia Federal prosseguem outras investigações que podem levar a novos indiciamentos tanto dele, quanto do seu candidato no Rio. A direita extrema se divide e não surge daí uma linha democrática. Do ponto de vista das ideias, a emergência climática é outra complicação. Atinge em cheio o negacionismo desse grupo político e da parte do agro que o apoia. Não há mais como negar.

A escolha do ministro Alexandre de Moraes como alvo do dia 7 de setembro é bem óbvia. Ele é o presidente do inquérito que mais ameaça Bolsonaro e a todos os que cometeram crimes na preparação e na execução da tentativa de golpe de 8 de janeiro. Por isso, ele diz que Moraes é “pior do que Lula”. Lula o derrotou em 2022. Moraes pode mandar prendê-lo. O ataque a Alexandre de Moraes tentou aproveitar o momento em que o ministro sofreu desgaste com a suspensão do X e por ter supostamente quebrado o rito ao pedir ao TSE informações públicas sobre perfis que defendiam golpe de Estado.

Na Paulista, Bolsonaro mentiu sobre a eleição que ganhou, a que perdeu e sobre seu adversário em 2022. Disse que foi eleito por uma falha do sistema em 2018 e que a eleição de 2022 foi manipulada por Alexandre de Moraes. Ou seja, continua afirmando ter havido fraude em duas eleições, segue fazendo acusações sem provas, denunciação caluniosa, contra o sistema eleitoral brasileiro. Isso é crime e ele é reincidente. Repete porque tem o projeto de minar a confiança na democracia.

Nem todos os que votaram em Bolsonaro concordam com essa visão conspiratória sobre as urnas ou desejam o fim da democracia. Do contrário teríamos 58 milhões de golpistas no Brasil. Mas é cúmplice quem, no palanque, consentiu pelo silêncio com essa mentira sobre o processo eleitoral. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, por exemplo. Ele nada tem feito que o diferencie do seu ídolo, apesar do contorcionismo das análises que sustentam ser Tarcísio da direita moderada.

O fato de Bolsonaro não ter ameaçado diretamente a democracia não significa qualquer moderação. Ele agora não tem os poderes que já teve. Era um perigo quando ameaçava as instituições e tinha de fato o poder de feri-las com a força da Presidência, com o fato de ser o comandante em chefe das Forças Armadas e com o peso da máquina pública do Executivo. Agora não tem mais esse poder, exceto o de continuar incutindo que não se pode confiar no processo eleitoral brasileiro em quem o segue e em quem vai até uma manifestação convocada por ele.

Ele está sob investigação por isso e muito mais, dado que foi das palavras para as conspirações e as ações. Também sob investigação está o seu candidato no Rio de Janeiro, Alexandre Ramagem. O inquérito da Abin Paralela tem fartas provas de que o uso mais intensivo da ferramenta First Mile de espionagem de supostos adversários políticos durante o período em que Ramagem comandava a Abin. Pior, em 49% das vezes que a ferramenta foi utilizada, isso ocorreu durante o período eleitoral de 2020. Há muitos outros indícios de crime de uso da máquina pública contra supostos adversários políticos ou para favorecer pessoas da família de Bolsonaro.

Ramagem também representa a maior derrota de Bolsonaro, porque há pouca possibilidade de reversão do quadro eleitoral no Rio de Janeiro, com vitória praticamente certa do atual prefeito Eduardo Paes. O Rio é o reduto no qual Bolsonaro construiu toda a sua vida política e a dos seus filhos. Eduardo foi para São Paulo por uma circunstância familiar. Na disputa paulista também o que se vê é que o prefeito Ricardo Nunes foi esquecido no fundo do palanque e o candidato Pablo Marçal usou a passeata para fazer seu show à parte.

A derrota talvez mais permanente desse grupo político é no negacionismo que eles sempre exibiram em relação à ciência e à mudança do clima. Os eventos extremos estão levando prejuízo ao agronegócio, que majoritariamente votou em Bolsonaro. A política do “passar a boiada” perdeu. A opinião pública está cada vez mais convencida das causas ambiental e climática. Eles foram derrotados na aposta e no discurso. Não têm agenda nem resposta para a grave crise do século XXI.

(com Luciana Casemiro)


Fonte: O GLOBO

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