Anúncio de que três hospitais do grupo no Rio deixarão de atender beneficiários do plano de saúde expõe crescente restrição em rede credenciada, dizem especialistas
Porto Velho, Rondônia - O anúncio pela Rede D’Or de que três de seus principais hospitais na capital fluminense — Copa D’Or, Quinta D’Or e Jutta Batista — deixarão de atender beneficiários da Amil a partir de 17 de setembro, como antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim, é vista por especialistas como um retrato da fragilidade dos usuários de planos de saúde diante de crescentes mudanças na rede credenciada originalmente contratada.
No mercado, o entendimento é que o movimento reflete uma queda de braço entre Amil e Rede D’Or em torno de negociações sobre o valor da remuneração pago pela operadora por prestação de serviços. O resultado é uma restrição na oferta de hospitais ao cliente da operadora de saúde.
— É um problema grave no Rio de Janeiro, não acontece no Brasil como um todo. É como uma estratificação da estratificação nos planos de saúde, empurrando a classe média, que é quem usa a saúde suplementar, para baixo. Ao invés de dar poder de escolha a essas pessoas, vai reduzindo a escolha de manter o atendimento habitual, perto de casa — pontua Lígia Bahia, especialista em saúde pública e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (Iesc) da UFRJ. — A rede se restringe. Os melhores hospitais ficam com os planos mais caros.
Os usuários de planos de saúde de forma geral, continua ela, estão cada vez mais pressionados diante da alta de preços, da oferta restrita de planos individuais e familiares — que têm o índice de reajuste limitado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) —, além de descredenciamentos recorrentes em rede de atendimento, o que, em muitos casos, resulta em rebaixamento na qualidade do produto contratado.
Na entrada do Copa D’Or, comunicado de que atendimento será suspenso a partir de 17 de setembro — Foto: Foto de leitor
Na avaliação de Lígia, a Amil sinaliza estar buscando um nicho menos classe alta, enquanto a Rede D’Or iria na direção oposta.
‘Viramos reféns’
Usuários da Amil impactados pela interrupção do atendimento nesses hospitais já avaliam migrar para outra operadora de saúde. É o caso do servidor público carioca Leonardo Murad, de 42 anos.
— A decisão é um baque. E nos revolta porque viramos reféns dessa briga entre duas gigantes do setor de saúde. Procuramos o plano com a rede credenciada que queríamos, que temos costume de usar. Agora, vamos perder nossos três hospitais — reclama ele, que era originalmente cliente da Golden Cross, cuja carteira passou a ser operada pela Amil. — Está difícil migrar para outra operadora, a maior parte dos planos é por adesão com coparticipação. Falta oferta de individuais.
A Rede D’Or comunicou sua decisão no fim de julho. E exibe sinalizadores na entrada dessas unidades explicando que deixará de atender beneficiários da Amil “por questões administrativas”. A Amil, por sua vez, disse ter sido surpreendida pela iniciativa. E afirmou que está reforçando sua rede credenciada com hospitais equivalentes para garantir a cobertura hospitalar a seus usuários.
A disputa entre Amil e Rede D’Or não é de agora. Em meados de 2019, a operadora decidiu descredenciar 17 unidades do grupo hospitalar no país, sete deles no Rio de Janeiro. Na época, a explicação foi de que a decisão foi motivada por uma divergência sobre a forma de pagamento.
Em junho daquele ano, a Amil somava 3,45 milhões de beneficiários em planos de assistência médico-hospitalar, segundo dados da ANS. Em dezembro, a carteira encolhera para 3 milhões. Dois anos depois, os dois grupos retomaram as relações comerciais.
No fim de 2023, a Amil foi comprada por José Seripieri Filho, fundador da Qualicorp, com R$ 9 bilhões em passivos. De lá para cá, a Amil assumiu a gestão da carteira da Golden Cross, um caminho para ampliar a escala da operação. Em junho quando a carteira de clientes chegou a 2,66 milhões de usuários, anunciou um acordo com a Dasa, reunindo 25 hospitais dos dois grupos e dando origem a um dos maiores do setor no país, ficando atrás da Rede D’Or.
Em paralelo, conta uma fonte, a Amil vem trabalhando para verticalizar ao máximo o atendimento de seus usuários, ampliando o uso de sua rede própria de hospitais, enquanto negocia novos acordos de remuneração com prestadores.
Comunicado ao Cliente
Marina Paullelli, advogada do programa de Saúde do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), diz que operadoras de saúde e prestadores de serviço estão autorizados a fazer alterações em sua oferta, mas há regras a seguir:
A mudança na rede a partir de setembro já consta no site da Amil, que afirma que irá comunicar os usuários — Foto: Reprodução
— Se sai um hospital, ele deve ser substituído por outro da mesma qualidade para não prejudicar o beneficiário. O consumidor tem de ser comunicado claramente da alteração com antecedência de 30 dias. E as internações têm de ser mantidas até a alta médica.
A mudança na rede a partir de setembro já consta no site da Amil, que afirma que irá comunicar os usuários.
A especialista do Idec frisa que mudanças na gestão dos planos de saúde têm de ser ponto de atenção para a agência reguladora. E que, quando se sentir lesado, o consumidor deve recorrer à ANS para garantir a qualidade do atendimento contratado.
A Rede D’Or informou que o descredenciamento das três unidades é pontual e o atendimento dos beneficiários da Amil nos demais hospitais segue normalmente. Ao todo, o grupo tem 16 hospitais na cidade. Procurada, a ANS não respondeu até a publicação desta reportagem.
Fonte: O GLOBO
Porto Velho, Rondônia - O anúncio pela Rede D’Or de que três de seus principais hospitais na capital fluminense — Copa D’Or, Quinta D’Or e Jutta Batista — deixarão de atender beneficiários da Amil a partir de 17 de setembro, como antecipou o colunista do GLOBO Lauro Jardim, é vista por especialistas como um retrato da fragilidade dos usuários de planos de saúde diante de crescentes mudanças na rede credenciada originalmente contratada.
No mercado, o entendimento é que o movimento reflete uma queda de braço entre Amil e Rede D’Or em torno de negociações sobre o valor da remuneração pago pela operadora por prestação de serviços. O resultado é uma restrição na oferta de hospitais ao cliente da operadora de saúde.
— É um problema grave no Rio de Janeiro, não acontece no Brasil como um todo. É como uma estratificação da estratificação nos planos de saúde, empurrando a classe média, que é quem usa a saúde suplementar, para baixo. Ao invés de dar poder de escolha a essas pessoas, vai reduzindo a escolha de manter o atendimento habitual, perto de casa — pontua Lígia Bahia, especialista em saúde pública e professora do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (Iesc) da UFRJ. — A rede se restringe. Os melhores hospitais ficam com os planos mais caros.
Os usuários de planos de saúde de forma geral, continua ela, estão cada vez mais pressionados diante da alta de preços, da oferta restrita de planos individuais e familiares — que têm o índice de reajuste limitado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) —, além de descredenciamentos recorrentes em rede de atendimento, o que, em muitos casos, resulta em rebaixamento na qualidade do produto contratado.
Na entrada do Copa D’Or, comunicado de que atendimento será suspenso a partir de 17 de setembro — Foto: Foto de leitor
Na avaliação de Lígia, a Amil sinaliza estar buscando um nicho menos classe alta, enquanto a Rede D’Or iria na direção oposta.
‘Viramos reféns’
Usuários da Amil impactados pela interrupção do atendimento nesses hospitais já avaliam migrar para outra operadora de saúde. É o caso do servidor público carioca Leonardo Murad, de 42 anos.
— A decisão é um baque. E nos revolta porque viramos reféns dessa briga entre duas gigantes do setor de saúde. Procuramos o plano com a rede credenciada que queríamos, que temos costume de usar. Agora, vamos perder nossos três hospitais — reclama ele, que era originalmente cliente da Golden Cross, cuja carteira passou a ser operada pela Amil. — Está difícil migrar para outra operadora, a maior parte dos planos é por adesão com coparticipação. Falta oferta de individuais.
A Rede D’Or comunicou sua decisão no fim de julho. E exibe sinalizadores na entrada dessas unidades explicando que deixará de atender beneficiários da Amil “por questões administrativas”. A Amil, por sua vez, disse ter sido surpreendida pela iniciativa. E afirmou que está reforçando sua rede credenciada com hospitais equivalentes para garantir a cobertura hospitalar a seus usuários.
A disputa entre Amil e Rede D’Or não é de agora. Em meados de 2019, a operadora decidiu descredenciar 17 unidades do grupo hospitalar no país, sete deles no Rio de Janeiro. Na época, a explicação foi de que a decisão foi motivada por uma divergência sobre a forma de pagamento.
Em junho daquele ano, a Amil somava 3,45 milhões de beneficiários em planos de assistência médico-hospitalar, segundo dados da ANS. Em dezembro, a carteira encolhera para 3 milhões. Dois anos depois, os dois grupos retomaram as relações comerciais.
No fim de 2023, a Amil foi comprada por José Seripieri Filho, fundador da Qualicorp, com R$ 9 bilhões em passivos. De lá para cá, a Amil assumiu a gestão da carteira da Golden Cross, um caminho para ampliar a escala da operação. Em junho quando a carteira de clientes chegou a 2,66 milhões de usuários, anunciou um acordo com a Dasa, reunindo 25 hospitais dos dois grupos e dando origem a um dos maiores do setor no país, ficando atrás da Rede D’Or.
Em paralelo, conta uma fonte, a Amil vem trabalhando para verticalizar ao máximo o atendimento de seus usuários, ampliando o uso de sua rede própria de hospitais, enquanto negocia novos acordos de remuneração com prestadores.
Comunicado ao Cliente
Marina Paullelli, advogada do programa de Saúde do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), diz que operadoras de saúde e prestadores de serviço estão autorizados a fazer alterações em sua oferta, mas há regras a seguir:
A mudança na rede a partir de setembro já consta no site da Amil, que afirma que irá comunicar os usuários — Foto: Reprodução
— Se sai um hospital, ele deve ser substituído por outro da mesma qualidade para não prejudicar o beneficiário. O consumidor tem de ser comunicado claramente da alteração com antecedência de 30 dias. E as internações têm de ser mantidas até a alta médica.
A mudança na rede a partir de setembro já consta no site da Amil, que afirma que irá comunicar os usuários.
A especialista do Idec frisa que mudanças na gestão dos planos de saúde têm de ser ponto de atenção para a agência reguladora. E que, quando se sentir lesado, o consumidor deve recorrer à ANS para garantir a qualidade do atendimento contratado.
A Rede D’Or informou que o descredenciamento das três unidades é pontual e o atendimento dos beneficiários da Amil nos demais hospitais segue normalmente. Ao todo, o grupo tem 16 hospitais na cidade. Procurada, a ANS não respondeu até a publicação desta reportagem.
Fonte: O GLOBO
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Economia