Manifestantes anti-imigração e islamofóbicos atacaram mesquitas, delegacias e até hotel que abrigava solicitantes de asilo no país; mais de 700 pessoas foram detidas
Foto de arquivo mostra migrantes esperando por ajuda do navio Abeille Languedoc depois que o gerador de seu barco quebrou em águas francesas, enquanto tentavam atravessar ilegalmente o Canal da Mancha — Foto: Sameer Ai-Doumy / AFP
Ao todo, segundo o Ministério do Interior britânico, 11 embarcações realizaram a perigosa travessia neste domingo. No amanhecer, porém, autoridades francesas receberam o aviso de que um dos barcos estava com “dificuldades”, e que havia pessoas na água. Como resposta, 53 migrantes foram resgatados. Dois deles, no entanto, não puderam ser reanimados: um morreu ainda no porto, e o outro no hospital.
O naufrágio de domingo elevou para nove o número de pessoas que perderam a vida nessas travessias no mês – e para 25 desde o início deste ano, superando de longe as 12 mortes registradas em 2023. Segundo uma contagem da AFP baseada em números das autoridades britânicas, pelo menos 18.342 pessoas realizaram a travessia desde janeiro. O número é 13% maior do que o registrado no mesmo período do ano passado.
A chegada dos 700 migrantes ocorre após o Reino Unido ter enfrentado manifestações violentas anti-imigrantes e islamofóbicas – as piores desde 2011 no país. Os distúrbios foram inicialmente alimentados por ativistas de extrema direita nas redes sociais. Por esses canais, foi espalhada desinformação sobre um ataque a faca que matou três meninas durante uma aula de dança temática sobre a cantora Taylor Swift.
A polícia deteve o suspeito de 17 anos, mas rumores sobre a nacionalidade e religião dele foram rapidamente espalhados – e posteriormente desmentidos pelas autoridades. Ainda assim, centenas de manifestantes atacaram mesquitas e entraram em confronto com a polícia. Forças de segurança britânicas disseram que os responsáveis seriam “apoiadores da English Defence League”, grupo de extrema direita que organiza protestos anti-muçulmanos desde 2009.
Menos de duas horas após o esfaqueamento, de acordo com a Associated Press, um usuário conhecido como European Invasion escreveu no X que o agressor era “alegadamente um imigrante muçulmano”. Em pouco tempo, a mesma publicação apareceu no Facebook e no Telegram, segundo a empresa Logically, que monitora e combate a desinformação. O boato foi incluído num artigo publicado pelo Channel 3Now, site que teria supostas ligações com a Rússia.
Na sequência, o texto foi citado por agências de notícias russas, incluindo RT e Tass. No X, a Logically escreveu que é “provável” que o Channel 3Now seja “um ativo russo destinado a semear informações com objetivo de causar danos e criar divisão no Reino Unido”.
Tensões latentes
As publicações que mobilizaram multidões em protestos no país exploravam principalmente as tensões crescentes sobre a imigração, incluindo o crescente número de migrantes que entraram no país ilegalmente atravessando o Canal da Mancha. Essas preocupações têm sido tão importantes na região que foram tema central da eleição do mês passado, com o ex-primeiro-ministro Rishi Sunak prometendo parar os barcos improvisados e deportar os “imigrantes ilegais” para a Ruanda.
O atual primeiro-ministro, Keir Starmer, chegou a cancelar o plano de Sunak após ter tido uma vitória esmagadora – mas prometeu reduzir a imigração trabalhando com outras nações europeias e acelerando a remoção de solicitantes de asilo rejeitados. Em meio à onda de protestos da última semana, Starmer declarou que sua prioridade “absoluta” era acabar com a instabilidade, e que o governo tomará “todas as medidas necessárias” para pôr fim à desordem.
Organizados sob o lema Enough is enough (Basta), manifestantes atiraram tijolos, garrafas e sinalizadores nos agentes de segurança – ferindo vários policiais –, enquanto saqueavam e queimavam lojas, entoando insultos anti-islâmicos. Mesquitas e uma delegacia também foram atacadas, além de instalações comunitárias como um hotel que abrigava solicitantes de asilo e que foi incendiado pelos protestantes. No total, mais de 700 pessoas foram detidas e 300 acusadas.
Fonte: O GLOBO
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