Em entrevista ao GLOBO, professor de Harvard e coautor também de “Como salvar a democracia” assegura que atentando dará 'apenas um empurrãozinho' ao republicano nas pesquisas
Porto Velho, Rondônia - Desde que o ex-presidente americano Donald Trump, confirmando na segunda-feira como candidato do Partido Republicano à Presidência, sofreu um atentado durante um comício na Pensilvânia, no último sábado, o celular de Steven Levitsky, professor da Universidade de Harvard e coautor, juntamente com Daniel Ziblatt, de “Como as democracias morrem” e de “Como salvar a democracia”, lançado em 2023 no Brasil, não parou de tocar.
Jornalistas do mundo inteiro querem saber o que está pensando Levitsky, que em seu último livro aborda os riscos que enfrenta a democracia americana e analisa especialmente o Partido Republicano, sobre o impacto da tentativa de assassinato na campanha de Trump. Ao GLOBO, o professor de Harvard disse que "Trump ganhou uma oportunidade de se apresentar como um candidato que promete unidade, paz etc… mas ele não conseguirá sustentar isso por muito tempo”. Na opinião de Levitsky, é pouco provável que o candidato republicano seja o mais votado na eleição, mas, se tivesse de apostar hoje, diria que Trump será, pelas características do sistema eleitoral americano, o vencedor.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Que impacto o atentado contra Trump poderá ter na campanha e na candidatura do ex-presidente?
Existe muita incerteza, mas imagino que ajudará Trump de uma maneira modesta, não gigantesca. Ajudará em vários sentidos. Primeiro, lhe dá alguns dias de notícias simpáticas, favoráveis a ele, que é claramente a vítima. Acho que ele não ganhará tanto tempo de notícias positivas como aconteceu com a facada de Bolsonaro no Brasil, porque, naquele caso, a vida de Bolsonaro correu perigo e foram muitos dias no hospital. Durante muito tempo, foi impossível criticar Bolsonaro na campanha. Neste caso, serão apenas alguns dias.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Que impacto o atentado contra Trump poderá ter na campanha e na candidatura do ex-presidente?
Existe muita incerteza, mas imagino que ajudará Trump de uma maneira modesta, não gigantesca. Ajudará em vários sentidos. Primeiro, lhe dá alguns dias de notícias simpáticas, favoráveis a ele, que é claramente a vítima. Acho que ele não ganhará tanto tempo de notícias positivas como aconteceu com a facada de Bolsonaro no Brasil, porque, naquele caso, a vida de Bolsonaro correu perigo e foram muitos dias no hospital. Durante muito tempo, foi impossível criticar Bolsonaro na campanha. Neste caso, serão apenas alguns dias.
O impacto na cobertura e na campanha será muito diferente. Mas Trump ganhou uma oportunidade, sobretudo na Convenção Nacional Republicana, de se apresentar como um candidato que promete unidade, paz etc… de se mostrar menos duro. Mas ele não conseguirá sustentar isso por muito tempo, será apenas um empurrãozinho nas pesquisas. Outro elemento, mais indireto, é que essa distração nas notícias desviará a atenção dos problemas que enfrenta a campanha democrata. Isso poderia ajudar Biden a permanecer como candidato.
Biden deixará de ser pressionado?
Sim, e, nesse caso, isso também vai favorecer Trump. Muitos discordam de mim, mas acho que Biden é o pior candidato que tem hoje o Partido Democrata. Como me disse um político democrata que já foi muito importante, em 2020 Biden era o único democrata que podia derrotar Trump. Hoje ele é o único democrata que não pode derrotar Trump.
Em seu último livro, o senhor se refere a Trump como um líder de minoria, que não representa uma maioria nos EUA e nunca ganharia a maioria dos votos entre americanos. Faz alguma autocrítica nesse sentido?
O que dissemos no livro é que o governo de 2016 [de Trump] foi um governo de minorias. Nas últimas décadas, somente em 1988 o Partido Republicano [com George W. Bush pai] obteve a maioria dos votos, e não podemos prever se isso vai voltar a acontecer. Claro que é possível que Trump ganhe o voto popular, e vários fatores tornariam isso mais possível, sobretudo o fato de que os candidatos já no cargo sofrem em todos os lugares.
Biden deixará de ser pressionado?
Sim, e, nesse caso, isso também vai favorecer Trump. Muitos discordam de mim, mas acho que Biden é o pior candidato que tem hoje o Partido Democrata. Como me disse um político democrata que já foi muito importante, em 2020 Biden era o único democrata que podia derrotar Trump. Hoje ele é o único democrata que não pode derrotar Trump.
Em seu último livro, o senhor se refere a Trump como um líder de minoria, que não representa uma maioria nos EUA e nunca ganharia a maioria dos votos entre americanos. Faz alguma autocrítica nesse sentido?
O que dissemos no livro é que o governo de 2016 [de Trump] foi um governo de minorias. Nas últimas décadas, somente em 1988 o Partido Republicano [com George W. Bush pai] obteve a maioria dos votos, e não podemos prever se isso vai voltar a acontecer. Claro que é possível que Trump ganhe o voto popular, e vários fatores tornariam isso mais possível, sobretudo o fato de que os candidatos já no cargo sofrem em todos os lugares.
Parte do voto por Trump é simplesmente um voto de cansaço com o governo, um voto de oposição ao oficialismo. A fraqueza de Biden é outro fator, e agora, talvez, o atentado. Mas nosso ponto é que o Partido Republicano, no século XXI, até agora, foi um partido minoritário beneficiado pelas instituições.
Quais são as probalidade de que Trump ganhe no voto popular?
Pouco provável. Acho que não chegará a 50% dos votos. Trump nunca teve esse nível de apoio, sempre, no seu melhor dia, está em torno de 40%. Não é um candidato majoritário. Poderá ganhar no voto popular por certas circunstâncias geradas pelos deuses, mas é pouco provável.
Se Trump for eleito, ter sido vítima de um atentado poderá dar-lhe elementos para ser um presidente mais autoritário?
Em muitas democracias, esses atentados ocorrem, nos Estados Unidos tivemos sete atentados entre 1963 e 1981. As democracias perfeitamente podem sobreviver a atentados presidenciais. As causas da crise americana estão em outro lugar, mas é verdade que o atentado reforça o radicalismo da base de Trump. Quase 100% dos seguidores de Trump acreditam participar de um movimento histórico, quase messiânico, e acreditam em teorias conspiratórias contra eles.
Quais são as probalidade de que Trump ganhe no voto popular?
Pouco provável. Acho que não chegará a 50% dos votos. Trump nunca teve esse nível de apoio, sempre, no seu melhor dia, está em torno de 40%. Não é um candidato majoritário. Poderá ganhar no voto popular por certas circunstâncias geradas pelos deuses, mas é pouco provável.
Se Trump for eleito, ter sido vítima de um atentado poderá dar-lhe elementos para ser um presidente mais autoritário?
Em muitas democracias, esses atentados ocorrem, nos Estados Unidos tivemos sete atentados entre 1963 e 1981. As democracias perfeitamente podem sobreviver a atentados presidenciais. As causas da crise americana estão em outro lugar, mas é verdade que o atentado reforça o radicalismo da base de Trump. Quase 100% dos seguidores de Trump acreditam participar de um movimento histórico, quase messiânico, e acreditam em teorias conspiratórias contra eles.
O atentado contra Bolsonaro afetou a campanha, mas não a democracia brasileira. Trump é um autocrata, tentou dar um golpe, roubar uma eleição. Ele já está dizendo, antes da eleição, que vai usar o Estado para investigar e perseguir seus rivais, que vai atacar os meios de comunicação, que vai usar o Exército para reprimir protestos, usar a Guarda Nacional para expulsar do país entre 15 milhões e 20 milhões de pessoas.
[venezuelano Hugo] Chávez, [turco Tayyip] Erdogan, ou sequer [russo Vladimir] Putin jamais foram tão abertamente autoritários em suas campanhas antes de chegar ao poder. Esse é o problema. O Partido Republicano abraçou um candidato abertamente autoritário. A situação já era muito complicada antes do atentado.
Chamou a atenção do senhor o perfil do franco-atirador?
Nem um pouco. Temos um problema sério de saúde mental, de armas na sociedade e uma política polarizada, sobretudo nas redes sociais. Que um jovem obviamente com problemas mentais pegue uma arma e tente matar um candidato a presidente não era inevitável, a probabilidade era alta. O atentando não me surpreendeu nem um pouco.
O senhor acredita na hipótese do lobo solitário?
Não acredito em teorias da conspiração. Até que me demonstrem o contrário, vou acreditar que foi um lobo solitário, como é na maioria dos casos.
Trump pediu a união nacional e se vitimizou. Biden disse que o atentado era inadmissível. É possível acalmar os ânimos na campanha?
Desde 1981 não tínhamos vivido um atentado assim. Foi um choque tremendo para a sociedade e, nesse sentido, seria possível que os ânimos se acalmassem. Mas também acho pouco provável. A sociedade pode ficar afetada por algumas semanas e depois voltarmos para a mesma polarização. Dependerá do comportamento dos líderes.
Muitos consideram que Trump já está eleito…
Não diria isso. Vai ajudar um pouco Trump, mas a crise de Biden já o estava ajudando. Hoje apostaria por Trump, é mais provável que ele ganhe, mas ainda é cedo.
O companheiro de chapa de Trump muda em alguma coisa a campanha?
Acho que não, porque Trump absorve toda a atenção. Me chama a atenção que tenha escolhido outro homem branco, porque Trump tentava ampliar sua coalizão. Não ter escolhido um candidato de minorias sugere, talvez, um pouco de arrogância. Acho que ele considera que tem a vitória garantida.
Fonte: O GLOBO
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Mundo