Número de brasileiros com fome cai para 8,4 milhões, diz ONU

Número de brasileiros com fome cai para 8,4 milhões, diz ONU

Apesar de avanço, Brasil segue no Mapa da Fome, com 3,9% de subnutridos no triênio encerrado em 2023, mostra relatório. Estudo mostra ainda que 31 milhões deixaram a insegurança alimentar moderada ou grave

Porto Velho, Rondônia - Estudo feito por cinco agências especializadas da Organização das Nações Unidas divulgado nesta quarta-feira mostra que 8,4 milhões de brasileiros passaram fome no Brasil entre 2021 e 2023 ou 3,9% da população. É menos que no triênio 2020-2022 (10,1 milhões), quando o país ainda estava sob intensos efeitos da pandemia de Covid-19 e essa condição atingia 4,7% dos habitantes. No mundo, 733 milhões passavam fome no ano passado.

A melhora no caso brasileiro já havia sido verificada em outros estudos do IBGE, embora com metodologias diferentes. O avanço, porém, não foi o suficiente para tirar o Brasil do Mapa da Fome da entidade, segundo os dados do relatório Estado da Segurança Alimentar e da Nutrição no Mundo (SOFI, na sigla em inglês).

São 1,7 milhão de brasileiros subnutridos a menos do que no triênio encerrado em 2022, mas a ONU coloca no Mapa da Fome os países que possuem mais de 2,5% da população nessa condição. O Brasil voltou ao Mapa da Fome durante a pandemia, do qual estava fora, pelo menos, desde o triênio de 2014 a 2016.

O ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias, disse nesta quarta-feira, no evento de lançamento do relatório, que o país deve sair do Mapa da Fomes até 2026.

– No caminho que estamos é possível sair do mapa da fome até o fim do governo, em 2026 – disse ele.

O estudo também mostra que no triênio encerrado no ano passado, 39,7 milhões de brasileiros, ou 18,4% da população, enfrentavam insegurança alimentar moderada ou severa. Em comparação com o triênio 2020-2021, quase 31 milhões de brasileiros deixaram essa condição, na passagem do triênio de 2020 a 2022 para o triênio de 2021 a 2023.

Programas de transferência de renda

Reflexo do efeito do programa Bolsa Família turbinado de forma permanente – em meados de 2022, o governo Jair Bolsonaro elevou o benefício mínimo do então Auxílio Brasil para R$ 600 por mês, e o valor foi mantido na retomada do Bolsa Família, com o novo governo Luiz Inácio Lula da Silva, a partir de 2023.

No período de 2020 a 2022, tomado quase na totalidade pelos momentos mais graves da crise causada pela Covid-19, 70,3 milhões de brasileiros enfrentavam insegurança alimentar moderada ou severa, ou 32,8% do total da população, segundo o SOFI de 2023.

Na comparação com o triênio 2014-2016, houve aumento do número de pessoas que sofrem de insegurança alimentar no país, segundo o relatório. Nesse período, havia 27,2 milhões de pessoas com insegurança alimentar moderada ou severa ou 13,3% da população.

Fome ainda afeta 8,4 milhões de brasileiros — Foto: Márcia Foletto/Agência O Globo

As definições do estudo são as seguintes:

Prevalência de subalimentação ou subnutrição: indivíduos que não consomem, na média diária, a dieta energética suficiente para manter uma vida normal e saudável;
Insegurança alimentar severa ou moderada: a partir de um questionário de oito perguntas respondido em entrevistas, um modelo calcula como as pessoas são classificadas na escala de insegurança alimentar.

De acordo com o relatório, a América Latina teve uma queda significativa na insegurança alimentar no ano passado. Em 2022, o percentual era de 31,4% e no ano passado, de 28,2%, quando se considera a insegurança alimentar severa ou moderada. Isso equivale a uma redução de 20 milhões de pessoas de um ano para o outro.

Lançamento no Rio

A ONU lançou o SOFI de 2024 no Rio, em meio aos encontros diplomáticos do G20 (grupo de 19 grandes economias globais, mais a União Europeia e a União Africana) que começaram na segunda-feira e vão até sexta na cidade. É a primeira vez que o relatório é lançado em uma cidade que não seja Nova York ou Roma.

O enfrentamento à fome e à pobreza é uma das três prioridades colocada pelo Brasil na presidência rotativa do G20, ao lado da reforma das instituições de governança global e do apoio ao desenvolvimento sustentável.

O relatório da ONU foi publicado pouco antes de o Brasil dar a partida na principal proposta nesse tema prioritário, a Aliança Global Contra a Fome.

Os documentos de formalização da iniciativa serão assinados numa reunião ministerial para tratar da iniciativa, comandada pelo presidente Lula, no Galpão da Cidadania, na Gamboa, zona portuária do Rio. O lançamento formal está previsto para a cúpula de líderes marcada para novembro, também na capital fluminense, segundo o ministro de Relações Exteriores, Mauro Vieira.

De adesão voluntária para países, empresas, fundos de financiamento, entre outros, a aliança pretende funcionar como uma plataforma para conectar, de um lado, países que se comprometam a implementar políticas públicas de erradicação da fome e, de outro, parceiros capazes de oferecer conhecimento técnico e apoio financeiro para colocá-las em prática.

Documento aponta para a falta de financiamento

Apesar do otimismo do governo brasileiro com o lançamento inicial da Aliança Global Contra a Fome, ainda não há anúncios formais de investimentos financeiros na iniciativa, problema destacado pelo SOFI de 2024.

Segundo o relatório da ONU, “o mundo ainda está distante do caminho para atingir o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável (ODS) 2, de Fome Zero”, a apenas seis anos de 2030, quando as metas deveriam ser atingidas. Para chegar lá seria preciso de financiamento “aumentado e com melhor custo-benefício”, mas “não há atualmente um sinal claro” de que haverá os recursos necessários, diz um trecho do SOFI de 2024.

Intitulado “Financiamento para erradicar a gome, a segurança alimentar e a má nutrição em todas suas formas”, o documento deste ano cita uma série de estudos que procuraram estimar o montante necessário para acabar com a fome no mundo até 2030.

Os valores vão de US$ 176 bilhões (R$ 982 bilhões) a US$ 3,98 trilhões (R$ 22,2 trilhões, o equivalente a cerca de duas vezes todo o PIB anual do Brasil). “As estimativas saltam repentinamente para US$ 15,4 trilhões (R$ 85,9 trilhões), quando são adicionados tipos de políticas transformacionais que exigiriam financiamento para aumentar a disponibilidade de dietas saudáveis para milhões ao mesmo tempo em que se reduz a subnutrição”, diz o relatório.

733 milhões passam fome no mundo

No mundo todo, 733 milhões de pessoas estavam na condição de subnutrição, apenas em 2023, segundo o SOFI de 2024. É como se uma em cada 11 pessoas no mundo passasse fome.

O número salta para 2,312 bilhões de pessoas quando se considera as pessoas que enfrentavam insegurança alimentar moderada ou severa, no triênio de 2021 a 2023. É o equivalente a 29% da população mundial.

A comparação do SOFI de 2023 com o deste ano mostram que o quadro global praticamente não se alterou no ano passado.

Segundo o relatório publicado nesta quarta-feira, a falta de acesso a alimentos seguiu crescendo na África, onde uma em cada cinco pessoas passa fome – 57,7% da população do continente enfrentam insegurança alimentar moderada ou severa –, ficou estável na Ásia e teve “progresso notável” na América Latina e no Caribe, como mostram os dados para o Brasil.


Fonte: O GLOBO

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