Delegado cita 'comportamento violento' de dupla presa. Quadrilha teria promovido ataques entre povos originários
As investigações apontam que os dois líderes Tembé criaram uma espécie de milícia e vinham liderando uma série de conflitos armados na disputa por terras produtivas de dendê, de onde se extrai o azeite de dendê, também conhecido na indústria como óleo de palma. Além da utilidade no ramo alimentício e de cosméticos, trata-se de uma das matérias-primas mais eficientes para produção de biocombustíveis e está em alta no mercado internacional.
O delegado federal Vinícius Lima, à frente do inquérito, esclarece que não se trata de uma tribo inteira comandada por uma milícia, mas sim de um grupo criminoso privado e supostamente chefiado pelas duas lideranças. A organização contaria também com não-indígenas.
— As tribos não se transformaram em milícias. Algumas lideranças constituíram milícias privadas com não indígenas — frisa. — Algumas ações violentas e criminosas são mobilizadas por indígenas e com participação e fomento dessas lideranças. Então, não é uma questão da comunidade indígena, são essas duas lideranças específicas que têm esse comportamento violento. Boa parte da comunidade age pacificamente sem ter problema.
Lima afirma que a polícia ainda investiga de onde viriam as armas e o dinheiro que financia a suposta organização criminosa. Segundo ele, o inquérito foi instaurado por conta do "aumento da violência da comunidade indígena". A ação teve como objetivo "restabelecer a ordem pública na região de Tomé-Açu, sobretudo em relação aos conflitos que envolvem as comunidades tradicionais".
Os investigadores pontuaram que "existem disputas entre os próprios Tembés e também deles com quilombolas, por terras produtivas de dendê". A apuração detectou ainda que os presos se valiam das condições de lideranças para o cometer diversos crimes, inclusive contra a própria comunidade indígena.
Um dos indígenas teve mandado de prisão cumprido no Aeroporto Internacional de Belém. Também investigado por uma suposta ameaça a servidores do Ibama, ele estava a caminho de São Paulo quando foi abordado por uma equipe da Polícia Federal.
O outro líder foi preso pela Polícia Rodoviária Federal, com base em informações apuradas pela PF e pela Polícia Civil. A abordagem foi na rodovia BR-010, a caminho do município de Tomé Açu.
Briga entre indígenas e empresa de extração de dendê
Nas regiões de Tomé-Açu e Vale do Acará, há uma antiga e complexa disputa territorial travada entre os povos originários e a empresa Brasil BioFuels (Grupo BFF) — antiga Biopalma —, que extrai e produz mais de 200 toneladas do óleo de palma anualmente em cerca de 75 mil hectares na Floresta Amazônica. De um lado, indígenas afirmam que a BFF avança sobre territórios demarcados e que age com violência; do outro, a empresa diz que atua em áreas autorizadas e que sofre com "invasões ilegais" e igualmente violentas.
Em junho do ano passado, após uma tentativa de assassinato contra o cacique Lúcio Tembé, a promotoria paraense chegou a citar que, desde a instalação da empresa, em 2008, "vários episódios de violência contra indígena ocorreram". O posicionamento fez com que o grupo reagisse, afirmando que "Tomé Açu e Acará estão dominadas pelo crime" e que "invasores indígenas e o crime organizado tomam conta do local".
A nota dizia ainda que "as áreas invadidas se tornaram pontos de tráfico de drogas, motivação da tentativa de assassinato do cacique", e acrescentava que "trabalhadores e moradores são vítimas desta teia do crime, que age no roubo de frutos de dendê para vendê-los a empresas receptadoras que atuam de forma ilegal na região".
Procurada nesta terça-feira (30) pelo GLOBO, após a notícia da prisão das lideranças indígenas Tembé, o Grupo BFF afirmou que "não teve qualquer participação no caso" e que "a companhia reforça promover diálogo aberto e construtivo com as comunidades onde atua, buscando o bem viver e o desenvolvimento socioeconômico do entorno de suas operações na região Amazônica".
A reportagem não conseguiu contato com representantes da Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu, cujo líder foi preso, ou com a Federação dos Povos Indígenas do Pará. Também procurada, a secretária estadual dos Povos Indígenas do Pará e líder da etnia, Puyr Tembé, não retornou o contato.
No ano passado, em nota assinada pelo líder da Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu, Paratê Tembé, de 29 anos, os indígenas afirmaram que a BBF tentou, através de seu posicionamento, "criminalizar suas lideranças e a luta que travada pela retomada de seus territórios ancestrais, ocupados atualmente pela empresa".
"A BBF, aproveitando-se dos eventos que cercam a tentativa de homicídio de uma de nossas principais lideranças, o cacique Lúcio Tembé, passou a fazer acusações graves e mentirosas contra o nosso povo, com o intuito leviano de desvirtuar as narrativas e ofuscar a verdadeira origem dos problemas que fazem parte do cotidiano de nossas aldeias", dizia a nota.
"Em nota enviada à imprensa pela empresa, insinuam e tentam vincular os indígenas à práticas criminosas que não fazem parte das nossas tradições e as quais abominamos, como tráfico de drogas. Nosso povo não tem nenhuma associação com grupos criminosos que atuam na região, como quer fazer parecer a empresa. Ao contrário disso, como já mostrou a investigação comandada pelos órgãos de segurança, o cacique Lúcio Tembé foi alvo de um atentado justamente por combater possíveis usuários e traficantes de drogas em nossa Terra Indígena", prossegue.
"As ilações da BBF contra o nosso povo nos deixa em uma situação ainda maior de vulnerabilidade porque desperta a revolta popular contra nós indígenas, porque faz com que seus funcionários alimentem um ódio injustificável contra nossas lideranças, as mulheres, crianças e todos os integrantes das nossas aldeias", conclui o texto.
Fonte: O GLOBO
Procurada nesta terça-feira (30) pelo GLOBO, após a notícia da prisão das lideranças indígenas Tembé, o Grupo BFF afirmou que "não teve qualquer participação no caso" e que "a companhia reforça promover diálogo aberto e construtivo com as comunidades onde atua, buscando o bem viver e o desenvolvimento socioeconômico do entorno de suas operações na região Amazônica".
A reportagem não conseguiu contato com representantes da Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu, cujo líder foi preso, ou com a Federação dos Povos Indígenas do Pará. Também procurada, a secretária estadual dos Povos Indígenas do Pará e líder da etnia, Puyr Tembé, não retornou o contato.
No ano passado, em nota assinada pelo líder da Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu, Paratê Tembé, de 29 anos, os indígenas afirmaram que a BBF tentou, através de seu posicionamento, "criminalizar suas lideranças e a luta que travada pela retomada de seus territórios ancestrais, ocupados atualmente pela empresa".
"A BBF, aproveitando-se dos eventos que cercam a tentativa de homicídio de uma de nossas principais lideranças, o cacique Lúcio Tembé, passou a fazer acusações graves e mentirosas contra o nosso povo, com o intuito leviano de desvirtuar as narrativas e ofuscar a verdadeira origem dos problemas que fazem parte do cotidiano de nossas aldeias", dizia a nota.
"Em nota enviada à imprensa pela empresa, insinuam e tentam vincular os indígenas à práticas criminosas que não fazem parte das nossas tradições e as quais abominamos, como tráfico de drogas. Nosso povo não tem nenhuma associação com grupos criminosos que atuam na região, como quer fazer parecer a empresa. Ao contrário disso, como já mostrou a investigação comandada pelos órgãos de segurança, o cacique Lúcio Tembé foi alvo de um atentado justamente por combater possíveis usuários e traficantes de drogas em nossa Terra Indígena", prossegue.
"As ilações da BBF contra o nosso povo nos deixa em uma situação ainda maior de vulnerabilidade porque desperta a revolta popular contra nós indígenas, porque faz com que seus funcionários alimentem um ódio injustificável contra nossas lideranças, as mulheres, crianças e todos os integrantes das nossas aldeias", conclui o texto.
Fonte: O GLOBO
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