Sexta-feira, 14 de março de 2025

Após quase 40 anos, Brasil tem novo sistema tributário. Veja os próximos passos

Após quase 40 anos, Brasil tem novo sistema tributário. Veja os próximos passos

Deputados comemoram a aprovação da Reforma Tributária
O texto aprovado suprime algumas das mudanças feitas pelo Senado, mas mantém os princípios básicos da proposta, de simplificação e modernização do sistema

Em uma votação histórica, a Câmara dos Deputados aprovou na sexta-feira, em dois turnos, a Reforma Tributária. Foram 371 votos a favor e 121 contrários. O texto será promulgado na próxima semana, marcando uma mudança histórica no sistema de impostos do país.

Após quase quatro décadas de discussões, o Brasil caminhará para um modelo já adotado em outros países, com unificação de impostos e facilitação da cobrança. O impasse, que dura desde a redemocratização, chega ao fim após uma série de negociações entre Câmara e Senado, além da participação do Ministério da Fazenda.

Terminada a votação, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou:

— A Câmara e o Senado marcam definitivamente, com a votação de hoje, um grande feito.

Haddad: alíquota de 27,5%

O texto aprovado suprime algumas das mudanças feitas pelo Senado, mas mantém os princípios básicos da proposta, de simplificação e modernização do sistema tributário. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, comemorou o resultado e disse que a alíquota geral do imposto, após as alterações na proposta, deve se manter na faixa de 27,5%, patamar que havia sido estimado pela pasta quando foi concluída a votação no Senado.

— Vamos recalcular o impacto, mas vai variar em torno disso — afirmou.


O que é a reforma tributária?

Haddad afirmou que ele e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ligaram para os relatores da reforma nas duas Casas — Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) na Câmara e Eduardo Braga (MDB-AM) no Senado. Segundo o ministro, Lula também telefonaria para Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG):

— É um dia importante, há 40 anos se fala em Reforma Tributária no Brasil.

Os cinco impostos que existem para o consumo de bens e serviços (PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS) serão substituídos por uma única alíquota a ser paga pelo consumidor: o Imposto sobre Valor Agregado (IVA). O valor do tributo será definido posteriormente em lei complementar. E vai incidir no momento da compra, a chamada cobrança no destino.

— Construímos as soluções necessárias para a Reforma Tributária, que traga mais transparência, mais justiça, mais segurança jurídica e nos coloque em outro patamar de país em relação ao sistema tributário — disse Aguinaldo.

A discussão sobre a necessidade de uma reforma para tornar o sistema de impostos mais simples e mais equilibrado já dura quase 40 anos. O atual modelo brasileiro de tributação foi instituído na década de 1960 e sofreu algumas alterações na Constituição de 1988.

Ao longo dos anos, especialistas afirmam que a tributação sobre consumo se tornou disfuncional, complexa e ineficiente, o que fez o sistema ficar desequilibrado e injusto.

Lira convocou sessão para votar a proposta ontem, dia em que normalmente não há votações no Congresso, porque quer promulgar o texto na próxima semana.

A reforma teve uma primeira aprovação pela Câmara em meados do ano. Depois, foi para o Senado e voltou para análise dos deputados — nunca houve tanta convergência a respeito do tema entre as duas Casas. O texto aprovado está em discussão desde 2019, mas avançou de forma inédita como resultado de uma convergência de esforços entre o Congresso e o governo Lula.

A proposta sempre constava nos discursos de Haddad, que negociou pessoalmente o texto e aceitou um fundo anual de R$ 60 bilhões para estados.

A semana foi de intensas negociações para a Câmara chegar a um texto de consenso, apenas suprimindo alguns pontos do Senado, para que a reforma não voltasse para análise dos senadores.

Duas reuniões na quinta-feira à noite, entre Lira, Pacheco, Aguinaldo e Braga, selaram o acordo que permitiu a votação. Inicialmente, os senadores não admitiam abrir mão das exceções que a Casa incluiu no texto, mas aos poucos foram cedendo.

Um dos pontos de divergência entre as Casas era a Zona Franca de Manaus. O relatório de Aguinaldo mantém o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Ele será aplicado apenas a produtos de outras regiões que também são feitos na Zona Franca, para garantir a competitividade da região.

O texto aprovado pelo Senado determinava a cobrança da Cide (imposto). A diferença é que os recursos da Cide seriam destinados ao Amazonas, enquanto o IPI será nacional. Proteger a região é questão estratégica para a bancada do Norte e para Braga.

O relator retirou a cesta básica estendida (que daria redução de 60% na alíquota do imposto para alguns produtos), mas manteve a alíquota zero para a cesta básica. Foi mantida a prorrogação do incentivo para montadoras do Norte, Nordeste e Centro-Oeste até 2033, o que desagradou a outros estados.

Jabuti dos auditores

Foi incluído um jabuti (elemento estranho ao escopo original do projeto) no texto em destaque, que permite a governadores e prefeitos aprovarem leis nas assembleias para equiparar o salário de auditores fiscais ao teto salarial de servidores da União. Na prática, isso permitiria que a categoria tivesse a remuneração de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

No último destaque da votação, a Câmara não alcançou o quórum necessário para manter a incidência do imposto seletivo sobre armas e munições. Esse imposto incidirá sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Para Marina Thiago, cofundadora do Movimento Pra Ser Justo, a versão final ficou melhor que a anterior por ter reduzido um pouco as exceções e regimes diferenciados, ou seja, produtos e serviços que não serão tributados pela alíquota padrão do IVA:

— Exceções aumentam a complexidade da tributação, e muitos estudos apontam que elas acabam beneficiando as pessoas mais ricas.

Larissa Longo, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Tributação do Insper, considerou positiva a extinção da cesta básica estendida. Ela elogiou a redução no número de setores com regimes específicos, com a saída de transporte aéreo e saneamento.

— É só o começo. Os próximos dois anos serão muito intensos em discussão de legislação — disse Larissa, em referência às leis complementares necessárias para colocar o novo sistema de pé.


Fonte: O GLOBO

Postar um comentário

Please Select Embedded Mode To Show The Comment System.*

Postagem Anterior Próxima Postagem
Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga. Conteúdo acessível em Libras usando o VLibras Widget com opções dos Avatares Ícaro, Hosana ou Guga.