Prefeitura deve apresentar projeto de aterramento de fios em SP em 30 dias, diz promotor

Prefeitura deve apresentar projeto de aterramento de fios em SP em 30 dias, diz promotor

Silvio Marques havia ameaçado Enel com multa bilionária por excesso de fios e falta de fiscalização nos postes, mas conta do serviço pode ser paga pelo consumidor

A Prefeitura de SP deve apresentar dentro de 30 dias um projeto de aterramento das fiações de energia elétrica e de telecomunicações ao Ministério Público de São Paulo. O promotor Silvio Marques, que há dois anos negocia solução para a confusão da fiação nos postes da cidade, afirma que a Prefeitura tem intenção de fazer o aterramento dos fios e que o projeto técnico escolhido deverá ser apresentado até o fim deste mês ao Ministério Público.

Segundo Marques, a Prefeitura tem em mãos dois projetos técnicos para execução do aterramento e deve lhe informar qual é o escolhido. O preço orçado até agora é de R$ 200 milhões por 30 km de fiação linear e a pesquisa de execução foi feita em dois bairros com características distintas: Pinheiros, bairro nobre da zona Oeste, e Grajaú, na zona Sul, que fica na periferia.

O promotor afirma que há três fontes possíveis de custeio do aterramento. Um deles é com a criação de um imposto de melhoria a ser pago pelo consumidor beneficiado, o segundo é que o investimento seja feito pelo Tesouro Municipal e a terceira opção é que seja financiado pela Contribuição de Custeio do Serviço de Iluminação Pública (Cosip), que já é cobrada na conta de luz e paga por todo contribuinte que tem um imóvel ligado à rede de abastecimento de energia elétrica.

Devido à negociação em curso, se o Ministério Público de São Paulo decidir apurar os motivos do apagão iniciado com o temporal que atingiu a cidade na última sexta-feira, é possível que o promotor Silvio Marques fique com a tarefa.

A negociação sobre a fiação excessiva é decorrente de uma investigação aberta em 2019 pelo promotor, que prometeu ir à Justiça cobrar uma multa bilionária da Enel, de distribuição de energia, e das empresas de telefonia móvel e internet pelo emaranhado de fios nos postes da cidade. 

Na época, Marques afirmou que a multa seria aplicada por dano moral coletivo aos moradores da capital paulista. Na época, o promotor afirmou que acompanha o caso desde 2012 e que a Enel "não faz nada" para resolver o problema, que já era grave. Lembrou que os postes são usados diariamente pelas empresas de telefonia e internet e que não há fiscalização, criando uma situação de "descalabro".

Segundo resolução da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), cabe à dona dos postes, no caso a Enel, fazer a fiscalização da fiação instalada nos postes. As empresas de telecomunicações pagam mensalmente à Enel pelo uso de "pontos de fixação" de seus fios nos postes e demais equipamentos de apoio à distribuição de energia elétrica.

Aterramento é solução, dizem especialistas

Para Roberto D'Araújo, integrante do Ilumina - Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Energético, enquanto os fios da rede de distribuição não foram aterrados, os problemas vão continuar — e se acentuar com as mudanças climáticas.

— Trata-se de um projeto de cidade. Aqui está se escolhendo manter os fios nos postes. É preciso de um esforço envolvendo o poder público — prefeitura, governo estadual e federal — para aterrar a rede de distribuição. Não é barato, mas vamos ver eventos piores se isso não for feito. Estamos muito atrasados — afirma Roberto D'Araújo, que é o engenheiro eletricista e ex-funcionário de Furnas e da Eletrobras.

Além disso, lembra o especialista, os fios de energia em postes trazem risco de acidente, já que a rede de telecomunicações corre ao lado dessa fiação.

— E a fiação externa traz outro risco: com chuva, se as árvores encostam em um fio desencapado, há um curto-circuito. E as distribuidoras colocaram chaves comutadoras, que ligam e desligam a distribuição, para ver se o curto parou. O que acontece é um 'pico' de energia quando a chave é ligada o que pode provocar danos aos equipamentos doméstico -- explica o especialista.

Para Luís Dearo, presidente da APS, empresa de soluções em tecnologia elétrica e automação industrial da América Latina, numa metrópole como São Paulo é preciso investir e acelerar o aterramento dos cabos.

— Se essa rede de distribuição de energia estivesse de forma subterrânea, em toda a cidade, os cabos de média e alta tensão estariam mais protegidos. Além da proteção da infraestrutura e de evitar acidentes mais sérios, a manutenção fica mais fácil no dia a dia. Sabemos que fazer o aterramento não é fácil, mas é preciso acelerar para evitarmos situações como essas no futuro — afirma.

Lei de 2005 previa aterramento e é ignorada

Além disso, observa Roberto D'Araújo, as árvores plantadas nas grandes cidades como São Paulo estão enforcadas, ou seja, suas raízes estão presas pelo concreto. Numa ventania forte, elas tendem a ser derrubadas.

Na capital paulista, as avenidas Paulista e Brigadeiro Faria Lima são alguns poucos locais da cidade que têm a rede subterrânea. No passado recente, entretanto, houve iniciativas para avançar nessa seara.

Uma lei de 2005, regulamentada no ano seguinte, prevê a obrigação das concessionárias tornarem subterrâneo o cabeamento aéreo existente em até 250 quilômetros por ano, mas na prática isso nunca ocorreu.

Em 2015, o então prefeito Fernando Haddad (PT) editou uma portaria para aterrar os fios da cidade, e incluía as concessionárias nessa modernização da rede. Porém, o Sindicato da Indústria da Energia no Estado de São Paulo (Sindienergia) acionou a Justiça pedindo a suspensão da norma, e o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) suspendeu. 

O município foi até o Supremo Tribunal Federal (STF) tentar derrubar a decisão, mas o STF negou seguimento à ação sem julgar o mérito. O caso segue tramitando na Justiça Federal e não tem data para ser julgado em definitivo.

Em 2017, o então prefeito João Doria prometeu substituir 66 quilômetros de fios da rede aérea pela subterrânea, em uma parceria com a então concessionária AES Eletropaulo, mas o projeto não avançou como prometido. Na manhã desta segunda, o prefeito Ricardo Nunes citou a decisão judicial para justificar que a prefeitura não pode aterrar os fios.

O resultado é que os postes imperam na paisagem urbana paulistana e as vias são repletas de emaranhados de fios, que inclusive cortam as ruas de um lado para o outro.

O modelo de compartilhamento de postes, que rende valores às distribuidoras de energia, como a Enel, foi alvo de consulta pública e as propostas foram compiladas em setembro passado. Uma das novidades é a exigência que seja feito mapeamento dos postes e da situação atual dos "pontos de fixação" em uso pelas empresas de telefonia.


Fonte: O GLOBO

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