País deixaria de fixar taxa básica de juros e seguiria decisões do BC americano. Se a dolarização estabilizar o vizinho, demanda por produtos brasileiros poderia para de cair
Uma das principais propostas de Javier Milei, eleito neste domingo para presidir a Argentina pelos próximos quatro anos, é dolarizar a economia do país. Isso significa substituir o peso pelo dólar como moeda oficial.
O objetivo é debelar a inflação, que passa de 100% em 12 meses. Milei ainda terá de vencer as eleições presidenciais de outubro para tirar a proposta do papel. Mas o que mudaria para os argentinos e para os brasileiros, caso a mudança seja implementada? Veja abaixo:
O que significaria a dolarização da economia argentina?
A moeda oficial passaria a ser o dólar. Na Argentina, hoje, é permitido ter conta de poupança em dólar e a divisa serve de referência, mas a moeda corrente é o peso. Por exemplo, imóveis são negociados em dólar, mas o pagamento tem que ser feito em pesos. Muitos poupam em dólares, seja em conta no banco ou em dinheiro, “embaixo do colchão”.
Os salários passariam a ser pagos em dólar?
Sem o peso, o dólar passa a ser a moeda corrente para todas as transações, incluindo o pagamento de salários.
Os argentinos ficariam ricos com a economia dolarizada?
Não, porque depende da taxa de câmbio na troca dos pesos por dólares. Quanto maior a taxa, menor o valor, em dólar, de salários e rendimentos.
O que mudaria com a dolarização formal?
É esperado um tombo na inflação. E que a estabilidade de preços se mantenha, já que a inflação em dólar, geralmente, é baixa. Por outro lado, o país abre mão de algumas medidas de política econômica.
De quais medidas se abre mão com a dolarização?
Sem moeda própria, o governo não poderia mais fixar a taxa básica de juros, passaria a seguir os juros do Fed, o banco central americano. Se algum problema doméstico provoca uma recessão, não seria possível baixar juros para aquecer a economia. Se o Fed sobe os juros por algum motivo doméstico dos EUA, a economia argentina vai esfriar, mesmo que esteja estagnada.
E no caso de crises internacionais?
O país ficaria mais suscetível a choques externos. Uma alta nas cotações de matérias-primas negociadas em dólar, como o petróleo, pode afetar mais rapidamente a economia local.
Os serviços públicos, como saúde e educação, poderão ser afetados?
Com títulos de dívida em dólar, o governo perde margem de manobra nas contas públicas. Se uma crise derruba a arrecadação, para não ficar com um rombo, cortes de gastos podem ser abruptos, afetando serviços essenciais.
Apoiadores de Javier Milei levantam bandeira com sua imagem estampada em uma cédula — Foto: Hernan Zenteno / La nacion / GDA
Para o Brasil, o que muda se a Argentina dolarizar?
Recessão e inflação descontrolada derrubam a demanda argentina. Se a dolarização estabilizar o vizinho, a demanda por bens e serviços brasileiros poderia aumentar ou parar de cair. Operacionalmente, a troca de moeda faria pouca diferença, pois as transações entre os dois países já são em dólar.
A Argentina ficaria mais barata para o turista brasileiro?
O país tende a continuar sendo um destino barato. Depende da taxa de câmbio usada na troca, total do dinheiro em circulação, mas a tendência é que os preços em dólar sigam pelo menos tão baixos quanto atualmente.
Quais os obstáculos para a dolarização?
Faltam dólares para substituir todos os pesos. Estimativas para o valor necessário, dependendo do câmbio, vão de US$ 35 bilhões a US$ 50 bilhões, mas o banco central tem reservas de US$ 7,3 bilhões, em termos brutos, diz a consultoria 1816. O valor fica negativo quando se descontam os passivos.
Como ficariam os bancos?
Passariam a transacionar apenas com dólares, o que poderia ser um problema. Um fundo de reservas em dólar precisaria ser criado para lidar com eventuais problemas no sistema bancário, como foi feito no Equador e em El Salvador, que dolarizaram suas economias no início dos anos 2000. Não há casos de dolarização em economias de maior porte, como a argentina.
Como aprovar a dolarização?
Exigiria aprovação no Congresso, mas Javier Milei dificilmente terá maioria. Para a consultoria 1816, se o resultado das primárias se repetir nas eleições, o partido de Milei teria 15% dos deputados federais e 11% dos senadores.
Fonte: O GLOBO
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