Por que o apagão desta semana é diferente dos que o país enfrentou nos últimos 20 anos? Entenda

Por que o apagão desta semana é diferente dos que o país enfrentou nos últimos 20 anos? Entenda

Para especialistas, Brasil não enfrenta mais cenário de escassez de energia e desafio é equilibrar produção e consumo

O apagão da última terça-feira, quando 25 estados e o Distrito Federal ficaram sem luz por até seis horas, é diferente das outras crises que atingiram o setor elétrico nas últimas duas décadas, de acordo com especialistas ouvidos pelo GLOBO. Para eles, o Brasil desta vez enfrenta o desafio de equilibrar a produção e o consumo de eletricidade.

Jerson Kelman, ex-diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), lembra que neste ano o Brasil enfrenta um excesso de geração de energia, com o nível elevado dos reservatórios e o avanço de eólica e solar na matriz.

Dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) indicam que o nível dos reservatórios está em patamar recorde: as hidrelétricas de Sudeste/Centro-Oeste estão com 82,1% de capacidade, patamar mais elevado para agosto em toda a série histórica iniciada em 2000.

Infográfico sobre o momento do apagão de 15/08/2023 — Foto: Editoria de Arte

As fontes solar e eólica já somam 18,8% do total da matriz. As termelétricas representam 8,1%, seguidas da nuclear, com 2,7%. O desafio do setor hoje, diz Kelman, é aumentar a gestão entre essas diferentes fontes.

— Nos últimos vinte anos, tivemos problema de falta de energia. Não teve chuvas e isso afetou o setor como um todo. Agora, vivemos um período de desequilíbrio entre a produção e o consumo e como as fontes térmicas e hidrelétricas conseguem responder de forma imediata quando há variação de energia das renováveis que dependem do sol e do vento — explica Kelman.

Em 2001, o país viveu um racionamento de energia com a falta de chuvas. Para evitar um apagão generalizado, o governo decidiu construir usinas térmicas de forma a aumentar a segurança energética. Em 2014, o Brasil viveu outra grave crise hídrica, afetando o governo da então presidente Dilma Rousseff.

Na ocasião, mais de 1.200 cidades, em 13 estados, chegaram a decretar estado de emergência ao longo do ano. Nos anos seguintes, lembram especialistas, o país começou a acelerar as políticas de ampliação de fontes renováveis como eólica e, mais recentemente, a solar.

infográfico mostrando o impacto do apagão de 15/08/2023 em 25 estados e no Distrito Federal — Foto: Editoria de Arte

Flexibilidade no sistema

Em 2021, houve outra grave crise hídrica, e o governo de Jair Bolsonaro iniciou uma série de ações para estimular o consumo consciente de energia. Diogo Lisboa, pesquisador do Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura da Fundação Getulio Vargas (FGV Cebri), diz que, se há dois anos o país quase teve racionamento, hoje o cenário é o inverso:

— Nos últimos dez anos, por conta das diversas crises hídricas, o país foi obrigado a ligar as usinas térmicas em um patamar acima do previsto. Agora, estamos em um cenário confortável com excesso de geração e sem pressão tarifária.

Assim, afirma Clarice Ferraz, economista e diretora do Instituto Ilumina, é justamente esse o problema atual do setor elétrico: a busca por equilíbrio e planejamento entre produção e consumo.

— Hoje estamos vivendo um excesso de geração. Não é só a falta de energia que gera apagão. O excesso também. Não adianta avançar com as renováveis, que são variáveis intermitentes, se as outras partes do sistema que vão garantir o equilíbrio, quando essas variações ocorrerem, não acompanharem. Todo o sistema tem que crescer junto, o que inclui os investimentos em transmissão para acompanhar esse avanço da geração de energia.

Para ela, o equilíbrio vem da flexibilidade no sistema a partir de termelétricas e hidrelétricas, além do investimento em outras fontes, como baterias e biomassa. Clarice afirma que o sistema precisa de uma rede com mais rapidez de indicação, em referência ao apagão de terça-feira.

— O sistema pode ter proteções ainda mais eficientes e tentar evitar que isso ocorra. É ter um sistema mais preventivo e que possa evitar que todo esse contágio ocorra — afirma


Fonte: O GLOBO

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