Yevgen Tishchenko e a mulher, Tetiana Komisarova, fizeram travessia com os quatro filhos, com idades entre 6 e 12 anos
Porto Velho, RO — Uma família que vivia na cidade de Mariupol, devastada pela guerra na Ucrânia, andou 125 quilômetros para fugir do conflito. Yevgen Tishchenko e a mulher, Tetiana Komisarova, saíram de casa após quase dois meses num porão e chegaram até a cidade de Zaporijia com os quatro filhos: Yulia, de 6 anos, Oleksandr, 8, Anna, 10, e Ivan, 12.
— Enquanto estávamos no porão, nós lhes explicamos por dois meses aonde iríamos... Nós os preparamos para essa longa jornada. Eles viram isso como uma aventura — disse Tetiana à AFP, ressaltando a ingenuidade das crianças.
A viagem difícil começou em 17 de abril. Aquele domingo foi a primeira vez que todos saíram juntos desde a invasão russa, em 24 de fevereiro. Ao longo das semanas, os adultos se revezavam para buscar comida e água para todos.
— Quando as crianças viram (a destruição), andaram em silêncio. Não sei o que passava na cabeça delas. Talvez também não acreditassem que nossa cidade não existia mais — lamentou a mãe.
A família carregou malas com a ajuda de um carrinho de três rodas, já antigo e enferrujado, que acabou apelidado de "carrinho de ouro". As crianças também se revezaram para descansar entre as bagagens.
— Minha esposa empurrou nossa filha mais nova em seu triciclo. E eu empurrava o carrinho, muitas vezes com uma das crianças empoleirada nas sacolas. As outras duas andavam ao meu lado — lembrou o pai.
Os seis passaram por vários postos de controle russos no percurso e diziam aos soldados que iriam encontrar parentes.
— Eles não nos trataram como inimigos, tentaram ajudar. Mas toda vez nos perguntavam: 'De onde você é? De Mariupol? Mas por que você está indo nessa direção, por que você não vai para a Rússia?' — disse Yevgen.
Ajuda encurtou viagem
À noite, a família dormia nas casas dos moradores que abriam as portas ao longo do caminho e gentilmente ofereciam bons pratos de comida. Durante o dia, seguiam em frente contra todas as adversidades. Assim foi a rotina em cinco dias e quatro noites de viagem.
A travessia a pé só não foi mais longa porque tiveram a sorte de encontrar Dmytro Zhirnikov, que dirigia por Polohy, uma cidade ocupada pelos russos e localizada a cerca de 100 quilômetros de Zaporíjia.
— Vi essa família empurrando um carrinho na beira da estrada. Parei e disse-lhes para colocar suas coisas no meu trailer — disse Zhirnikov, que viaja regularmente por Zaporíjia para vender os vegetais que sua família produz. Ele conta ainda que todos no carro choraram quando deixaram o território controlado pelos russos e viram soldados ucranianos.
Família Tichtchenko-Komissarova em um trem a caminho de Lviv, após viagem de 5 dias para fugir de Mariupol Foto: ED JONES / AFP
No dia 22, a família entrou num trem lotado em direção à cidade de Lviv, no Oeste do país. Eles planejam se mudar para Ivano-Frankivsk, outra cidade na mesma região, para tentar reconstruir uma vida normal.
— Quero encontrar um emprego. Minha esposa cuidará das crianças e tentará encontrar uma escola para elas. Nunca vamos esquecer o que passamos. Não devemos. Mas precisamos manter nosso ânimo e criar nossos pequeninos — disse Yevgen.
— Tínhamos apenas um objetivo: que nossos filhos pudessem viver na Ucrânia. Eles são ucranianos, não podemos imaginar que vivam em outro país — ressaltou Tetiana.
Fonte: O GLOBO